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MONOTEÍSMO CÓSMICO Sem dúvida nenhuma a grande revolução da segunda metade deste século foi a criação de uma consciência planetária. Durante toda a história da humanidade ela existiu e todos os grupos intuíam uma fraternidade que era, no entanto, demasiadamente abstrata para que pudesse ter um maior impacto na vida diária de nossos antepassados. Este final de século trouxe uma aproximação real de todos nós através das comunicações. A África entra em minha casa pela televisão, a Ásia me envia um fax, troco comentários pelo telefone com um amigo nos Estados Unidos, meu computador preenche sua tela com informações do Chile e amanhã de manhã posso estar na Europa. Mesmo que esta não seja uma realidade democrática, que existam inúmeras discriminações e aberrações que fazem com que esta realidade seja apenas de uma parcela da população, mesmo assim é hoje um fenômeno de massas. No início de nosso século, quando apenas dois por cento da população mundial era alfabetizada, qualquer realidade planetária poderia incluir inúmeras Nacionalidades, mas carecia do verdadeiro potencial criativo, inventivo ou sensível das massas que compunham a espécie de maior sofisticação de consciência do planeta. Este planeta não se conhecia como tal, mas como famílias, clãs, países e microecologias. Quando Moisés, influenciado talvez por sua educação egípcia, tornou o conceito do monoteísmo parte integral da cultura do Ocidente, muito possivelmente não podia visualizar o incrível alcance de sua proposta. Imerso numa era segmentada, o Deus único era uma revolução individual e nacional. Representava o fim do deus do bem e do deus do mal. O UM teria que abarcar ambos. Era o fim do meu deus em oposição ao teu deus, o UM era para: ambos. O deus do rico e do sucesso não mais poderia explicar-se como forte, mas teria também agora que prestar contas da realidade do pobre e do fracassado. O Deus único numa mentalidade de dimensões planetárias possui, por sua vez, outros níveis de complexidade ao ser compreendido como UM. Tem que ser o Deus do vencedor e do perdedor. Tem que responder pela justiça, não de uma nação, mas de todas, não apenas de uma espécie, mas de todas. Faz-se real como uma mentalidade que propicia paz e concernência ecológica. Não mais é um Deus que quer se impor pelas guerras, por mais "santas" que se justifiquem. Não quer impor-se pela linguagem de uma ou de outra tradição, mas sua afirmação está em ser Deus por todas as linguagens. Ser monoteísta planetariamente significa uma compreensão fundamental que o Deus de nossos amigos é o mesmo de nossos inimigos. Muito poucas pessoas sabem como categorizar um judeu. Não é incomum que este seja confundido com uma nação, uma raça, apenas uma religião ou uma civilização. Na verdade a descrição bíblica de um judeu - ou melhor, um "filho ou filha de Israel" -é daquele(a) que assume, muito além das responsabilidades éticas e espirituais do monoteísmo, também um compromisso com o mesmo. As responsabilidades dizem respeito à visão de seus dias, o compromisso é a relação com seja lá o que o futuro trouxer. A pergunta é como ser Israel, filho ou filha de Israel, num contexto planetário? Como ê "contender com Deus" (etimologia da palavra Israel) no mundo que se descortina? Arrisco uma resposta de que serão israelitas, neste novo desdobramento do compromisso (hoje planetário), aqueles que souberem ser profetas de uma justiça em nível planetário, que conseguirem perceber sua caminhada para a liberdade e para uma terra prometida que seja conjunta não apenas com seu próximo-povo, mas seu próximo-outro. Estamos num deserto vagando juntos em busca desta terra, todos nós cristãos, budistas, judeus, micos-leões-dourados, espíritas, baleias, muçulmanos, ozônios, protestantes, paus-brasil... Nosso Deus é UM planetariamente. Isto, até que sejamos levados a conhecer de forma não-abstrata outros que compartilham deste Universo, para além deste planeta... Neste dia Deus terá que ser UM cosmicamente e terá que dar conta não apenas da estética e do que é próprio deste planeta, mas de todos os outros mundos também. Neste dia Seu Nome será UM, Ela/Ele será UM. Neste dia nós seremos uma formidável consciência. *Rabino da Congregação Judaica do Brasil (RJ) e um dos expoentes do movimento de renovação judaica, ligado ao rabino Zalman Schachter. |